Dizem os cientistas que daqui a alguns milhares de anos ela desaparecerá. Aproveite para conhecê-la antes que isso aconteça...

p Entardecer em Anakena

Entardecer em Anakena

 

Texto e fotos: Jaime Bórquez

 

 

Contam aqui que no início das filmagens de Rapa Nui, seu produtor, o ator Kevin Costner, tinha muito receio de vir à Ilha de Páscoa e ser perseguido pelos fãs. Um dia criou coragem e seu jatinho particular aterrissou no aeroporto Mataveri, que corta de lado a lado o vértice sudoeste da ilha. De óculos escuros e roupa discretíssima, desceu do avião crente que uma massa iria despenteá-lo no afã de conseguir um autógrafo. Ledo engano. Absolutamente ninguém pulou no seu colo e nenhuma lente captou sua descida. Os pasqüenses não só não perceberam sua chegada como nem sequer sabiam quem era esse gringo ricaço. Costner voltou três vezes à ilha, sempre feliz por não ser reconhecido nem incomodado. Isto da uma pequena ideia da distancia física e psicológica que há entre os pasqüenses e o resto do mundo.

 

Depois de algumas horas de convívio com os habitantes da ilha, percebemos um fato inquestionável: não gostam da palavra pasqüense. Eles preferem o termo Rapa Nui e o usam para designar sua língua, a ilha, a si próprios e a praticamente tudo o que envolve sua cultura. Falam da comida rapanui, da beleza rapanui, da terra rapanui ou deles mesmos, os rapanui, mas nunca pronunciam o nome Ilha de Páscoa e menos ainda o gentilício pasqüense. Tudo isto poderia indicar que estamos frente a um caso de egolatria maior que a dos argentinos, mas a razão é muito mais poderosa que possuir um Gardel, um San Martin, um Maradona ou uma Evita Perón na sua história. O nome da ilha em idioma Rapa Nui é Te Pito o Te Henua e significa nada mais nem nada menos que Umbigo do Mundo. É impossível não se sentir importante quando se vive num lugar com um nome de tanto peso quanto este. Já pensou nisso? Ser habitante do umbigo do mundo, não das orelhas, nem dos braços, nem sequer da cabeça ou outras partes menos nobres, é uma responsabilidade muito grande. O umbigo é aquele ponto que nos manteve unidos ao milagre da vida e, ao nascer, é cortado para que sejamos livres. E nesta ilha a liberdade se sente principalmente ao não poder usar essas algemas que nos torturam na nossa continental civilização: o bendito celular e as comunicações em geral. Alias, as comunicações aqui são bastante básicas. Há tevê satelital, mas nenhuma rádio de ondas médias, salvo a própria emissora da ilha, não há bancas de jornal e os que chegam são a cada quatro ou cinco dias, dependendo da freqüência do vôo que vem do Chile. Porém há telefone e internet, é claro. Que alivio. Mas, a bem da verdade, quem deseja saber do mundo quando se está de férias?

 

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NÃO ACREDITAMOS EM BRUXOS, MAS...

 

Falaram-nos que há muita energia e mistérios guardados neste triângulo de 23 quilômetros de comprimento na base, por 15 e 16 quilômetros, em ambos os lados do triângulo. Grupos de místicos chegam até aqui para carregar as baterias. Mas, esta onda não é nada nova. Há vários gurus que exploraram a penugem misteriosa deste umbigo rodeado d’água por todos os lados. Já nos idos dos sessenta líamos extasiados as teorias de Pawels e Bergier no mítico livro O Despertar dos Mágicos. Nos anos setenta voltamos a olhar para os mistérios de Rapa Nui nos livros do holeteiro que virou escritor, o alemão Erich von Däniken. Foi um bombardeio esotérico-escatológico, com “Regresso às Estrelas”, “Lembranças do Futuro”, “Eram os Deuses Astronautas”, “O Ouro dos Deuses” e “A Mensagem dos Deuses”, entre outros. Mas, ao César o que é de César, o primeiro a falar dos mistérios e da energia mística da cultura Rapa Nui foi o aventureiro e navegante norueguês Thor Heyerdalh, já falecido, no seu livro “Aku Aku”. Não se precisa de muita imaginação para perceber que há pontos energéticos na ilha. Basta ir até o sitio de Te Pito Kura com uma bússola na mão para ter provas irrefutáveis disto. Neste lugar há uma pedra quase redonda com mais de meio metro de diâmetro, que possui um magnetismo tão poderoso que a bússola simplesmente perde o rumo e gira sem norte algum. Aqui as turmas esotéricas meditam até cair em prantos.

 

p Ahu Akivi

Ahu Akivi

 

Segundo a rapanui Maria Cecilia Cardinali, que atende grupos esotéricos na sua pousada, há seis pontos de energia, o mana em língua rapanui, na ilha. Eles são o ahu ou altar cerimonial dos sete moais de Akivi, a pedra oval de Te Pito Kura, a caverna de Te Pahu, um lugar específico no monte Terevaka, o mais alto da ilha, e outros dois que ela mantém em segredo. Ela diz que estas viagens são a procura de uma alma gêmea, título de um livro do brasileiro Paulo Kronemberg, primeiro guru divulgador do mana em terras verde-amarelas e homem muito querido em Rapa Nui. Vamos revelar mais um mistério da ilha e acredite se quiser: os maiores grupos de turistas esotéricos são de origem brasileira. Agora, entender este milagre custa pouco. Numa terra cheia de simpatias, crenças, mandingas, galinhas mortas, velas acesas e charutos nos becos e encruzilhadas só podia dar Rapa Nui como destino mor do esoterismo, concorda?

 

E.T. COME HOME

 

Há também visitantes que asseguram a presença extraterrestre na ilha, em um passado não tão distante. Tudo parte da falta de explicação científica à construção e translado daquelas enormes figuras de pedra que há espalhadas por toda a ilha, os misteriosos moais. De fato, eles impressionam até o mais frio dos turistas e deixam perguntas difíceis de ser respondidas por um leigo ou pelos guias do lugar, os quais logicamente botam ainda mais lenha nessa fogueira carregada de enigmas. Como, por quê e para quê fizeram essas 887 figuras que há por toda Rapa Nui? E como uma mole de pedra que pode pesar 80 toneladas e mais, percorreu distâncias de até 20 quilômetros sem sofrer nenhum atrito aparente? Estas perguntas são o atum nosso de cada dia na ilha e essa falta de resposta é o combustível que mexe em grande parte o motor do turismo. Sim, porque diga-se, au-passant, sem estes moais, verdadeiros garotos-propaganda do lugar, Rapa Nui seria mais uma ilha vulcânica neste mundo. Não estamos dizendo que não tenha lá suas graças, mas que o mistério e essas energias do passado pétreo são a alavanca que faz alguém cruzar os 3.700 quilômetros do mar do Pacifico que há do litoral chileno até lá, é uma verdade tão grande como um moai em pé, com chapéu incluído. Sim, muitos moais possuem um chapéu, que para alguns é um penteado. Estes chapéus são de pedra vulcânica vermelha e sua procedência é conhecida: a região de Puna Pau. Nem todos os guias levam ao lugar, mas vale a pena uma visita. Lá, num pequeno vale que tudo indica foi cratera, há vários chapéus jogados no chão. Se carregar um moai deve ter sido complicado, então que dizer de botar esse chapéu na sua cabeça. O transporte deles pode até ter sido fácil. São redondos e devem ter viajado rodando sem grandes problemas.

 

p Entardecer em ahu Tahai

Moai com chapéu - Entardecer em ahu Tahai

 

O vulcão Rano Raraku foi o canteiro de obras onde os antigos Rapa Nui realizaram seu trabalho megalítico. De suas paredes saíram as figuras previamente esculpidas e isso se percebe não só pelos espaços vazios, mas principalmente pelos moais que ainda dormem em suas encostas. Talvez o visitante não fique tão impressionado ao passar ao lado dos que há na trilha, mas é bom saber que eles estão enterrados e só vemos sua cabeça. Se quiser ter a visão real de uma figura inteira, há dois que devem ser visitados. O primeiro é um que está do lado direito do vulção, ainda sem ser arrancado da rocha. O outro, e mais famoso, é o gigante que dorme na encosta a poucos metros do anterior, caminhando a nossa esquerda. Tem 23 metros de comprimento e seu peso é estimado em 400 toneladas. Os deuses podem não ter sido astronautas, mas, os antigos rapanui, ao fabricar estas figuras misteriosas, colaboraram para que esta teoria não só se mantenha, como continue angariando adeptos.

 

p Vulcão Rano Raraku o canteiro dos moai p Vulcão Rano Kau

Vulcão Rano Raraku

 

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UMA VOLTINHA PELA ILHA

 

p Moai

 

Os moais estão geralmente instalados em plataformas de pedra, e esse conjunto arquitetônico leva o nome de ahu. Há dois que merecem uma visita. O maior de todos é o ahu Tongariki, com 15 estatuas, no setor leste da ilha. Ele foi recentemente reconstruído com muito trabalho e a ajuda inestimável de um guindaste poderosíssimo, cedido pelos japoneses. As figuras tombaram depois de que um tsunami, ocorrido no dia 22 de maio de 1960, passara pela ilha com ondas de 12 metros. Ele foi produzido pelo maior terremoto-maremoto que houve no Chile, considerado o maior cataclismo na história recente da Terra. Vendo hoje essas imensas estatuas em pé, dá para imaginar o poder da onda que varreu o lugar nesse dia de maio. Outro ahu interessante é o de Akivi, com cabalísticos sete moais. Dizem que ele possui muita energia e, além desse lado místico-energético, é o único que tem as figuras olhando para o mar. A explicação científica disto é que existia uma aldeia nesse lugar, e em rigor, os moais são sentinelas que protegiam os lugares. Por tanto, os sete moais de Akivi olhavam não para o imenso Pacífico e sim para a singela aldeia aos seus pés. Numa terra cheia do diz-que-diz, há quem diga que estas figuras estão orientadas com exatidão milimétrica para o equinócio de inverno. Outra corrente assegura que eles olham para a terra longínqua das Polinésia Francesa, de onde vieram um dia do século quarto ou quinto o Rei Otu Matu’a e seu séquito de incondicionais, para começar a civilização rapanui. Verdade ou não, existe uma ilha no arquipélago polinésio das Austrais cujo nome é justamente Rapa. Segundo os estudos do Dr. Sinoto, famoso arqueólogo japonês, não existe dúvida alguma que a cultura polinésia se enquadra e desenvolve dentro de um triângulo em cujos vértices estão Havaí, Nova Zelândia e Rapa Nui.

 

p Geoglifos em Orongo

Geoglifos em Orongo

 

Depois de se maravilhar com as figuras de pedra, é bom descobrir os outros atrativos da ilha. Eles existem, já dissemos. A cratera do vulcão Rano Kau é possivelmente o lugar mais impressionante da ilha. Ela tem 1,5 quilômetro de diâmetro e 200 metros de profundidade. É difícil não perder o fôlego ao ver tamanha obra da natureza. No fundo dela, há centos de lagoas de água doce separadas por manchões de sapé. Sente-se no mirante e curta o visual. O mana vai encher seu coração. No extremo sudoeste da cratera e numa estreitíssima planície, se encontra a aldeia cerimonial de Orongo, onde durante a primavera se desenvolvia a competição contada no filme Rapa Nui. A prova era nadar até uma das ilhotas que estão frente a Orongo, os chamados motus Kao Kao, Iti e Nui, e pegar o primeiro ovo do Manutara, uma andorinha de mar que chega à ilha nesses dias. Num mar bravio e com tubarões, os escolhidos de cada tribo nadavam até o local, pegavam o ovo e voltavam até Orongo, sem quebrá-lo, é claro. Quem conseguia o feito consagrava seu chefe como Tangata Manu, que reinava por um ano e guiava os destinos da ilha. Esta foi a forma que encontraram os antigos rapanui para eliminar as lutas internas e as guerras civis que estavam dizimando a população. Conta-se que Thor Heyerdalh descobriu em Orongo um observatório solar, que marca com precisão os equinócios de inverno e verão.

 

ALÉM DOS MOAI

 

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Mas, não só de arqueologia vive o viajante. Há também uma hora em que o mana precisa ser revitalizado. Para isso, nada melhor que pegar um velho calção de banho e vadiar nas praias de Anakena ou Ovahe, as únicas de Rapa Nui. A primeira é a maior da ilha e seu ibope é alto. Areia fina e branca, águas tranquilas, cristalinas e ligeiramente mornas. A pequena baia está protegida por coqueiros e há uma zona de piquenique, com mesas ad-hoc e banheiros públicos. É um bom lugar para passar a tarde e mesmo em alta temporada a praia nunca fica cheia. Outro mistério rapanui. Já Ovahe deve ser visitada bem cedinho de manhã, não porque encha de gente, aliás quase nunca se acha alguém por lá, mas sim porque o sol bate bem até meio dia. Depois a alta parede de rocha vermelha que protege suas costas faz sombra e a pequena prainha perde grande parte de seu encanto. Suas areias são cor de rosa e não é aconselhável tomar banho além das ondas. Quem avisa amigo é: tem forte ressaca e muitas rochas ocultas embaixo d’água. Ovahe vale pelo seu visual. Falando de visual, possivelmente há um que merece ser curtido. Trata-se da paisagem em 360 graus do mar do Pacífico que permite o monte Terevaka, o mais alto da ilha. Dali temos a impressão de perceber a curvatura da terra. Para chegar lá encima é preciso um jeep ou moto boa de trilhas. O caminho é tortuoso e quem não tem bom braço pode passar mais de algum susto com as inclinações, fendas, buracos e outros acidentes do percurso. Mas, vale a pena ir até lá. Não existe cartaz algum que indique o caminho, mas os misteriosos desígnios rapanui fazem que sempre cheguemos à terra prometida. Aliás, a sinalização turística da ilha é precária, para não dizer ruim mesmo. Por exemplo, não há cartaz com o nome das ruas. Às vezes umas letras na borda das calçadas dão nome aos bois rapanui. Mas ninguém se perde aqui. Os espíritos Aku Aku nos protegem, é claro.

 

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Praia de Anakena

 

p Praia de Ovahe

Praia de Ohave

 

Os amantes das teorias de Thor Heyerdalh, aquela que diz que a cultura Rapa Nui veio das costas do Peru em barcos feitos de sapé aproveitando as correntes, ficará extasiado ao visitar o sitio arqueológico de Vinapu. Aqui até o mais cético dos mortais se fará perguntas, por dizer o mínimo, ao ver as paredes do ahu semidestruído. Elas são únicas em toda a ilha e lembram com força as construções de Machu Picchu e Sacsayhuaman, do incásico império andino. Cortes e montagens perfeitas, rochas polidas com terminações curvas, precisas e belíssimas fazem de Vinapu um local de romaria para quem gosta dos enigmas da Terra.

 

Dentro dos passeios obrigatórios está o amanhecer no setor do ahu Tongariki e o pôr-do-sol visto desde o ahu Tahai, perto do povoado de Hanga Roa. Olhando daqui todos nossos mistérios ficam pequenos diante da beleza da natureza, que não requer explicação alguma.

 

Para ser uma ilha tão pequena, só 166 quilômetros quadrados, Rapa Nui tem bastante que mostrar. Um folheto turístico diz que esta é a ilha mais insular do planeta. Como assim? Perguntamos. A resposta foi fácil, esta é a ilha mais ilha da Terra, disse o rapanui com uma seriedade pétrea, megalítica e egocêntrica, como lhe cabe a um bom habitante do umbigo do mundo. Eis aí mais um mistério, desta feita linguística, a resolver. Que o mana nos ilumine e o nosso Aku Aku nos proteja.

 

p Moai em Rano Raraku p DSC 0768

 

 

COMO VIAJAMOS

 

Fiquei hospedado e fui tratado melhor que o rei Otu Matu’a no hotel Hangaroa. www.hangaroa.cl

Percorri a ilha graças ao veículo e dicas que me facilitou meu amigo rapanui Petero Riroroko, dono da agência Kia Koe Turismo, na própria ilha. http://www.kiakoetour.cl/

 

DICA IMPERDÍVEL

 

Mesmo que não goste de acordar cedo, faça o sacrifício e veja o amanhecer no ahu Tongariki. Depois tome banho em Ovahe e agradeça ao Criador o fato de você poder gozar as belezas, mistérios e energias desta ilha longínqua.

 

p Ahu Tongariki

Ahu Tongariki

 

NÃO ESQUEÇA

 

Levar roupa de banho e um bom calçado para caminhadas. Se tem licença de mergulho leve e não perca a oportunidade de sair nas excursões que oferece meu grande amigo Mike Rapu, na sua loja no cais da ilha. www.mikerapu.cl

 

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